Verdadeira identidade reduzida a cinzas, biografia envolta em fumos de mistério, Antônio José da Silva, O Judeu, parece fadado a ser uma personagem em busca de um autor precursoramente pirandelliano na concepção de que a vida é uma farsa trágica em que os homens, por necessidade de adaptação e sobrevivência, são atores-fantoches a representar um papel que eles próprios se impõem ou que lhes é imposto pela sociedade. Criptojudeu aos olhos do Santo Oficio; católico fervoroso e arrependido na retina dos dominicanos que o conheciam; vítima da cupidez amorosa de Frei Gil na peça Antônio José de Gonçalves de Magalhães e da ambição de Cottinel na novela O Judeu de Camilo Castelo Branco; comediógrafo engalfinhado com a hidra do establishment joanino na óptica de quantos o vêem crítico ferino da intolerância político-religiosa Antônio José da Silva está sempre a renascer das cinzas, fênix recriado à imagem e verdade de cada um. Afinal, quem foi esse carioca que, educado em Portugal, encenou suas peças no Teatro do Bairro Alto e foi condenado pela intolerância inquisitorial? A essa pergunta procura responder Concerto Barroco às Óperas do Judeu que a Editora Perspectiva põe agora à disposição do público de língua portuguesa. Através de acurado e arguto exame da comediografia de Antônio José, o estudo de Francisco Maciel Silveira chega a um retrato sem retoques do desafortunado Judeu, depois de desfazer criticamente a imagem que ao longo de 250 anos lhe foi erguida, seja pela ficção judiciária do Santo Oficio seja pela inventiva de criadores e críticos que lhe visitaram a vida e a obra. Qual esse retrato? Ora, por que antecipar o pasmo que reserva ao seu leitor o texto surpreendente desse Concerto Barroco às Óperas do Judeu?